domingo, 17 de abril de 2011

História do Tempo da Escuridão

As histórias, os mitos, do povo A'uwê, como se autodenominam os Xavante, são as narrativas ancestrais de um tempo de todas as criações.

A arte da oratória tradicional que os povos indígenas cultivam, principalmentes as pessoas mais velhas das comunidades, são geradas a partir de um conhecimento que é comum, patrimônio de um povo.

Compartilho os mitos do tempo da escuridão, da criação da lua e do sol, que fazem parte da Tradição do povo A'uwê, e que estão compilados no Livro Wamrême Za'ra - Nossa Palavra: mito e história do povo Xavante, que participei da coordenação e produção, pesquisa e fotografias.

Rómraréhã Rówasu'u

Eu vou contar.
Antigamente o povo A'uwê vivia na escuridão.
Antes da lua. Antes do sol.

Os wapté (adolescentes em reclusão) estavam assando ovos de ma (Ema). Comendo. Wapté tem respeito, dizem a verdade entre si.
- Como vocês quebraram ovos de ma?
- Nós quebramos batendo com os ovos no peito.
- Eu não acredito.
- É verdade! É verdade.
Eles não falaram a verdade.
Ovos de ma assados são muito quentes. É muito quente! Por isso eles inventaram...
Mesmo não acreditanto, o wapté bate com o ovo no peito. Então quebra.
Ele grita de dor.
- Asu ruru... Asu ruru...
Corre para o rio. De mão fechada. Grita de dor. Está gemendo.
Ele se joga na água para esfriar o peito. E fica rolando, rolando na água escura. Até no fundo da água.
Ele melhora, fica em pé.
Ele se transforma em lua.
A lua é branca. Brilha. Brilha como ovo de ema.
É assim que surgiu a lua.

Os wapté brincavam no lago.
Brincando de pular na água no pu (lago). Como os meninos brincam.
Decidiram subir nas árvores.
Começaram a brincar e subir em árvores.
- Em que árvore vocês estão subindo?
- Estamos subindo naquela árvore. Estamos subindo no uiwede (palmeira de buriti).
Ele vai subindo, subindo, subindo, muito alto.
É duro! Muito difícil!
A barriga cresce, aumenta. Ele faz muita força.
Estava planejado...
O ânus dele foi crescendo. Formando-se redondo, grande, quente.
Vai crescendo o ânus do wapté. Sai do corpo dele, de uma vez.
Fica fixo, brilhante no céu.
Vermelho, grande. Como quando está amanhecendo o dia. Vermelho e grande no céu.
Tão bonito!
Ele se tornou o sol. O verdadeiro sol.
É assim.
Ãné!


Copyright Cristina Flória - Todos os direitos reservados
Editora Senac SP - Wamrême Za'ra


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